sexta-feira, 28 de dezembro de 2012

Análise [4]: Fading Hearts - Outro exemplo que quantidade não quer dizer qualidade


Nossa, já fazia tempo desde que eu postei uma review de uma VN pra PC hein. Vamos então fechar esse ano de análises (minhas pelo menos) com um jogo que foi recentemente posto no catálogo da MangaGamer: Fading Hearts!

Um pouquinho de história antes de começarmos. Fading Hearts originalmente é uma visual novel da Sakura River e escrito em Ren'Py, uma das engines para visual novels open-source (ou seja, pode usar sem pagar nada) mais conhecidas atualmente e bem amigável para sistemas operacionais fora do Windows. Em 2009, a empresa estreou no mundo das visual novels com Fading Hearts Parallel, que foi nada menos que um tira-gosto para o seu lançamento principal (de qualidade bem inferior e frustrante, mas isso é coisa pra outro dia), Fading Hearts, lançado mais no final do mesmo ano. O jogo em si teve uma boa recepção, com análises positivas de vários blogs em inglês e parabenizando um jogo "indie" tão bem-feito, e como a MangaGamer não é boba nem nada, decidiu publicar o jogo para fazer uma graninha à mais.

A história de Fading Hearts começa simples: você é Ryou, um adolescente do colegial normal que possui duas amigas de infância, Claire e Rina. Entre alguns diálogos, uma nova personagem chamada Sophia chama o personagem principal e conta para ele sobre os rumores sobre os Wings of Light, um grupo expert em fazer qualquer garota se apaixonar por eles, eram verdadeiros, e que um dos ex-membros estuda na mesma escola que ele. Até aí, não há tanto mistério, mas alguns dias depois, Rina chega correndo na casa de Ryou e conta para ele que o namorado de Claire está abusando dela (eles usam esse termo mesmo, acredite), e ela quer que você a salve do namorado safado. Além desses personagens, têm o Alex, um amigo de longa data, a Tracy, uma empregada de um cosplay café que o Alex frequenta, e a Mystica, que é uma mahou shoujo da vida real... mas é melhor eu parar por aí porque tem mais coisa pra eu falar ainda.

A história de Fading Hearts... literalmente... só um pouquinho exagerada...
A história parece promissora, não? Dá pra ter muita conspiração com esses lances todos de Wings of Light, dos e-mails estranhos que Ryou recebe de um cara chamado Player que dá "dicas" de como pegar as meninas, da Mystica e da sua luta contra os "Shadows" que vivem na floresta e ameaçam a vida de muitas pessoas, do passado da Rina e de Ryou e do namorado da Claire. Pois é, é muita coisa pra se dedicar no universo do jogo, e para você descobrir tudo deste, você terá que jogar várias vezes, começando do New Game mesmo, já que o jogo não conta zerar um jogo a partir de um save já existente. Apesar disso, além de ser um ponto forte do jogo, também é um ponto fraco do mesmo, pois a imersão em cada uma desses temas não é lá essas coisas. Em muitas rotas, você pode passar o jogo inteiro sem nem se preocupar com o namorado da Claire, mas ela ainda, de algum jeito, se separa dele e confessa para o Ryou, ou mesmo quando a Rina confessa para você no comecinho do jogo (literalmente, é a primeira escolha que você tem que fazer no jogo... tá fácil, hein) e logo depois você passa a viver a bela vida de namorado e namorada... só que não, você tem que tentar salvar a Claire primeiro. Um coisa eu tenho que admitir: a história tem muitas reviravoltas no final das rotas, quando, por exemplo, ao descobrir a verdade sobre o Alex, da origem dos Shadows e a identidade da Mystica, mas... eu achei essas revelações muito "jogado na cara". Não tem música dramática em muitos desses momentos, ou CGs exageradas, ou raciocínio perspicaz típico de VN. O jogo simplesmente fala que as coisas são assim e o personagem principal as aceita sem fazer as perguntas mais pertinentes.

A Sakura River também promete que, além da história, há várias coisas para se fazer como usar magias (!), ganhar dinheiro trabalhando e poder escolher como usar o seu tempo livre. De fato, isso não é mentira, mas novamente é bem superficial. Você não trabalha diretamente, mas sim pode melhorar alguns parâmetros das empresas que já te dão dinheiro (quer moleza ou quer mais?) para ganhar mais ainda. Com esse dinheiro, você só pode gastar em 3 coisas: comprar livros e mangás, comprar mochilas maiores e passar o tempo em alguma lanchonete ou cosplay café (eventos da história são de graça, pelo jeito). Livros servem para melhorar sua condição física ou seu conhecimento e fazer você ganhar dinheiro ainda mais rápido, enquanto mangás te ensinam magias novas (só alguns volumes, no entanto). Mochilas servem para você poder ler livros e mangás fora de casa, mas como voltar pra casa não usa nada do seu tempo livre, você pode simplesmente voltar para casa sempre que quiser ler um livro, sem prejudicar o seu cronograma, o que o torna uma perda de dinheiro total. Passar o tempo em cafés da vida basicamente só recupera o seu PS (personal strength) mais rápido.

Aliás, outra inovação que o jogo queria mostrar é esse sistema de PS, onde, quanto mais PS você tem, mais opções são habilitadas durante conversações com outros personagens, mas se seu nível de PS for baixo, algumas opções de diálogo pode nem aparecer para você. Também é um sistema bem interessante, mas, de novo, é superficial, pois é muito fácil recuperar esses pontos nos próprios eventos da história, e mesmo se seu PS for baixo, as opções mais cruciais para o avanço da história dependem mesmo de suas escolhas anteriores. Ou seja, é a sua típica visual novel, e não aquela coisa foda que você imagina nos textos da empresa que fez o jogo.

O gráfico e detalhes das personagens e dos cenários são bem bonitos. Uma pena ter tão poucas CGs como esta.
Mas nem tudo que tem de bom no jogo tem que ter um "mas" meu para desmerecer. Os gráficos do jogo são bem feitos, considerando que é uma empresa independente e com poucos membros. Uma coisa que é difícil de contestar também é a liberdade que o jogo te dá, pois, tirando seus três amigos iniciais, você que decide no que quer investir o seu tempo. Apesar de você ter apenas um certo leque de opções e de não ter muitos eventos com a Rina e a Claire, dá pra zerar o jogo sem mesmo conhecer a Mystica, não dar a menor bola para a Sophia, e recusar ajudar a Claire ou conversar com a Rina. Aliás, eventos especiais apenas são ativados nesses casos, algo que te incentiva a jogar o jogo várias vezes, de jeitos diferentes. O jogo até conta com um sistema de conquistas, dizendo o que você ainda não descobriu sobre o jogo e ajudá-lo a ter o 100% de verdade dele. Uma pena que para você ver todas as conquistas disponíveis no jogo, você deve zerá-lo pelo menos 4 vezes começando pelo New Game.

Em contrapartida, têm os pontos ruins também desse jogo. Pra começo de conversa, é uma visual novel curta. O jogo demora mais ou menos 1 mês e meio no calendário virtual, mas os dias passam bem rápidos se não houver eventos específicos nele ou se você não decidir pagar uma de jogador de RPG e subir de nível na floresta todos os dias (o que não vai servir pra muita coisa, exceto em um rota ou outra). Dá pra completar o jogo tranquilamente em 4~5 horas, sem pular textos os coisa do tipo, e a partir daí, é coisa de 2~3 horas para zerar o jogo novamente, começando do New Game. A VN não tem vozes, e ao mesmo tempo não tem uma narrativa tão cativante ou misteriosa quanto, digamos, Narcissu ou Planetarian (ó o merchan do nosso grupo de tradução!) e a trilha sonora tem só umas 7 ou 8 músicas bem genéricas que não despertam nenhum sentimento em especial quanto às trilhas sonoras desses jogos que citei, além do fato que às vezes a música para sem qualquer motivo e nem toca outra mais dramática que poderia se encaixar bem na cena. Erros de tradução também são um tanto frequente, tanto em gramática quanto em concordância. Se fosse uma tradução de um jogo em japonês e fosse uma tradução lançada às pressas, até daria pra entender, mas o surpreendente é que esse jogo foi desenvolvido em inglês, logo não se trata de um problema desses, e sim de falta de tempo na revisão do jogo.

Até aqui você tem liberdade em escolher o que quer fazer. Só cuidado com as suas escolhas...
... nossa, e isso porque eu não falei dos buracos de roteiro do jogo. Literalmente. Por exemplo, tem um evento no final do jogo que você recebe uma carta de um "admirador secreto" para ir ao parque de noite, mas no final se encontra com Mystica, que diz que a Rina deve ser morta porque ela é a raiz dos Shadows que aparecem na floresta. Mesmo se você concordar que a Rina deve ser morta (o que é um absurdo, pois têm rotas que a ela não tem nada a ver com isso, colocando outra personagem como fonte dos problemas), há uma rota que você magicamente começa a sair com a Claire (sério, não tem opção e nem nada, o jogo simplesmente fala que depois de um tempo vocês começam a sair), e ao ir para uma viagem a Tóquio, você descobre que a Trident City foi destruída... e que você deveria ter lido a carta do admirador secreto e ido no tal parque. Porra, eu fui lá! Como assim você fala pra mim que eu não fui? Claro, isso pra não citar as rotas que a Claire magicamente se separa do seu namorado sem você fazer absolutamente nada e confessa para o Ryou, ou nos finais das rotas. Meu Deus, eu sei que o True End do jogo é o que vale (se é que isso se aplica aqui), mas sério, mesmo se você terminar o jogo com uma das meninas, você não sente que você zerou o jogo, parece que há um vazio na história e que o resultado final de ter ficado com uma menina ou outra não ter valido tanto a pena, já que, diga-se de passagem, as personagens evoluem praticamente nada desde o primeiro encontro até a última cena do jogo.

Em muitas VNs mais convencionais de empresas maiores, você chega a ter prazer em alcançar o final da história do jogo (nem precisa ser o True End), mesmo se o jogo for all-ages. Neste jogo, todos os finais que eu alcancei foram ruins aos meus olhos, até mesmo o "True End", que julgo eu que seja a rota Sole Survivor, a mais difícil de se obter. Não digo isso para criticar, mas simplesmente porque o jogo tem um grande potencial, mas que executa pouco na história, já que, tirando o bem final do jogo mesmo, o jogo é monótono demais, mesmo se você for jogar pela história ao invés de conseguir todas as conquistas possíveis.

Vacilou, hein, Meta-Ryou. Pena que na vida real não dê pra voltar na linha do tempo ou achar que tudo é um sonho.
Resumindo:

 - Pontos Fortes 
      *Liberdade nas escolhas
      *Várias tramas e reviravoltas nas rotas
      *Incentiva você a jogar de jeitos diferentes
      *Gráficos bem desenhados

 - Pontos Fracos
      *Personagens pouco desenvolvidas
      *Finais decepcionantes
      *Jogo começa bem, mas não mantém um ritmo interessante
      *Sem vozes e narrativa mal elaborada
      *Bugs em certas rotas/finais e erros de gramática não são raros
      *Muito poucas CGs

Nota: 6,0/10

Opinião final: O jogo tem tanto potencial quanto a Sakura River gosta de falar, mas infelizmente ele não é essa coca-cola toda. De fato é um jogo com bastante liberdade de escolhas e com reviravoltas bem imprevisíveis, mas que falha em entregar uma experiência igualmente avassaladora para o jogador, além de não narrar tão profissionalmente quanto outros jogos. Dentre visual novels independentes, é um jogo acima da média, assim como a minha nota de análise, mas que se o jogo fosse um pouquinho mais polido antes de ser lançado, aí sim poderia ser um título que bateria de frente a outros títulos mais arrojados e maiores.

Vale a pena comprar esse jogo?
Olha, mesmo com minhas críticas sobre o jogo, é difícil dizer. Mesmo com os defeitos dele, tem aquela velha história de "por que empresas pequenas não sobrevivem contra empresas grandes". Para um jogo independente, é um jogo acima da média sim, mas no ponto de vista pessoal (e acho que de várias pessoas também), eu quero que o meu dinheiro renda o máximo possível. No catálogo da MangaGamer, o jogo se encontra disponível por US$12,69 (aproximadamente R$26,00. O preço original é de US$14,95, uns 30 conto), o que não é um preço tão caro assim e se você tiver um cartão de crédito internacional fácil na mão, mas pelo mesmo preço, você pode comprar EVE Burst Error, que também é uma VN all-ages só que de qualidade incrível, mesmo depois de tanto tempo desde o seu lançamento original, e caso você possa desembolsar uns 5 dólares a mais, você já compra Kira*Kira (versão all-ages) ou Higurashi no Naku Koro Ni, duas VNs de grandes empresas que duram bem mais do que você zerar Fading Hearts 5 vezes, tendo dublagem de todos com exceção do personagem principal, muito mais garotas para escolher, um melhor roteiro e narrativa, e mesmo no caso de Higurashi que não tem vozes, tem um roteiro muito extenso, personagens bem marcantes, e uma história que vai ser difícil de você esquecer, isso sem contar os finais que são bem variados, e isso inclui os Happy Ends de verdade.

A dica é: se você já jogou EVE, Kira*Kira e Higurashi e quer gastar o seu restinho do dinheiro que ganhou de natal numa visual novel, até vale o investimento para incentivar a empresa a fazer algo melhor (no caso, o que vier depois de Infinite Game Works, já que este é pior ainda). Do contrário, o melhor mesmo é jogá-los antes para se ter uma base melhor de conhecimento de Visual Novels, e depois partir para os bichos-grandes como as VNs da Key, Ever17, Da Capo, Chaos;Head e Oretachi ni Tsubasa wa Nai.


Ufa, a análise de hoje foi longa. Amanhã a gente se vê de novo, e até a nossa próxima análise!
Out.

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